Publicado em Sexta, 27 Abril 2018 07:53
Quem lê uma notícia atualmente pode garantir que é verdadeira? Responder a essa pergunta ficou mais difícil depois da disseminação global das fake news na internet, principalmente quando 90% da população acessam conteúdo noticioso on-line. Estudiosos em comunicação identificam no fenômeno uma potencial ameaça à democracia, sobretudo depois que notícias imprecisas e até mentirosas influenciaram decisivamente comportamentos do cidadão em eleições em diferentes países.
Para equilibrar a liberdade de expressão e o direito à informação no Brasil, esses especialistas defendem a atuação do Poder Judiciário em casos de uso abusivo da liberdade de expressão.
A Lei n. 12.956, de 2014, que ficou mais conhecida como Marco Civil da Internet, atribui ao Judiciário o poder de decidir sobre conflitos relacionados não apenas às fake news, mas a qualquer conteúdo na internet que ofenda um cidadão em particular ou um grupo social específico. Quem se sentir ofendido deve denunciar ao provedor de conexão qual página da internet ou qual publicação divulgou o insulto.
Cabe ao provedor de conexão avaliar a retirada do material do ar, o que normalmente ocorre apenas em casos de violação explícita a reputações. Se o conteúdo for mantido, o ofendido deve procurar a Justiça. O provedor só poderá ser responsabilizado pela Justiça caso desobedeça ordem judicial determinada para remover o conteúdo.
A norma protege direitos individuais contra eventuais abusos, segundo a advogada Flávia Lefèvre, que representa o terceiro setor no Comitê Gestor da Internet (CGI.br). “O Marco Civil determinou que as queixas possam ser apresentadas aos juizados especiais, inclusive, para dar mais celeridade à tramitação desses processos. O Poder Judiciário é fundamental. Quem vai julgar o que é abusivo é o Poder Judiciário”, afirma a conselheira da entidade, que estipula diretrizes estratégicas ligadas ao uso e desenvolvimento da Internet no Brasil.
De acordo com a ativista do direito humano à comunicação Bia Barbosa, o Código Penal também defende pessoas físicas contra crimes que atacam a honra, a reputação ou direitos de personalidade. “Para responsabilizar quem ofende um cidadão com conteúdo, já existe a lei que prevê no Código Penal os crimes de difamação e calúnia, com os agravantes se o crime acontecer no ambiente da internet”, afirma.
Fake news e a Justiça
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu em 2012 o Fórum Nacional do Poder Judiciário e Liberdade de Imprensa. O objetivo da iniciativa é promover ações que garantam a liberdade de imprensa e o direito à informação. Nomeado pela presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, como coordenador da Comissão Executiva do Fórum, o conselheiro Márcio Schiefler reconhece a centralidade da Justiça no debate sobre fake news e valoriza o poder do senso crítico dos cidadãos.
"Devemos lembrar que também a imprensa tradicional merece o discernimento dos seus destinatários. No caso das chamadas redes sociais, embora seja mais difícil coibir a circulação de notícias falsas, o Poder Judiciário, como guardião das liberdades, tem tomado medidas para reprimir, seja em âmbito civil ou eleitoral, seja em âmbito criminal, condutas que maculem a sagrada liberdade de expressão.
Todos nós, como cidadãos, devemos adotar uma postura rigorosa ao recebermos e, principalmente, ao retransmitirmos as notícias em circulação", afirmou o conselheiro Schiefler.
Democracia ameaçada
Fake news não é uma invenção contemporânea, mas uma praga de nome estrangeiro ("notícias falsas", em inglês) que pode causar dano a algo maior, como a democracia, na medida em que a veiculação de notícias imprecisas, descontextualizadas ou simplesmente inverídicas tem formado opinião e afetado o debate político.
Quem lê o quê
Tanta influência se deve à transição nos hábitos de consumo de notícia, dos meios de comunicação de massa para a internet, e não só nos países desenvolvidos. A predominância da internet e das redes sociais na vida social tem influenciado, direta e indiretamente, quem lê o quê.