Jair Bolsonaro fez mau negócio ao eleger Luís Roberto Barroso como alvo. Ao contrário de Hamilton Mourão, o vice-presidente constantemente humilhado pelo inquilino inadimplente do Palácio do Planalto, o ministro não ocupa cargo decorativo. A sua caneta é das mais fortes da República. Ouvi certa vez de um integrante do tribunal que “um ministro do STF pode tudo”. A frase é ótimo resumo. Todos nós sabemos que pode mesmo, seja para o bem ou para o mal. Luís Roberto Barroso usa com relativa parcimônia a força que lhe confere a Constituição, mas está longe de ter uma personalidade titubeante. Sabe pesar a mão quando necessário, como quando ordenou que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, seguisse a lei e o regimento da casa e abrisse a CPI da Covid (o verdadeiro motivo do ódio de Jair Bolsonaro pelo ministro).
Experimentado na advocacia de verdade, não na dos embargos auriculares que fazem a fortuna de espertalhões em Brasília, Luís Roberto Barroso adquiriu frieza para fulminar adversários nos embates e domina como poucos a arte do direito. É mais cerebral do que a sua gentileza permite entrever. Mesmo quando se exaltou em público, como ocorreu naquele memorável julgamento em que disse umas verdades a Gilmar Mendes, ele calculou o instante certo para fazê-lo, deixando o antípoda sem reação.
Não menos importante, Luís Roberto Barroso é um homem de princípios. Não é alguém com quem se possa resolver diferenças — ou encontrar afinidades — na base das trocas de favores e tapinhas nas costas. Jamais receberia o presidente da República para uma pizza em casa, por exemplo. Também não acha que deve favores a este ou aquele, como demonstra a sua defesa da Lava Jato. São os princípios que o levam a continuar habitando a selva hostil do Supremo Tribunal Federal. Em certos instantes, ele foi aconselhado a desistir da sua cadeira e voltar para a advocacia, em posição ainda mais estelar do que já tinha antes da indicação para ministro, mas decidiu permanecer, imbuído do que acredita ser a sua missão.
Luís Roberto Barroso agora partiu para cima de Jair Bolsonaro, incluindo-o no rol de investigados no inquérito das fake news e dirigindo a abertura de um inquérito no TSE, que pode tornar o presidente inelegível, pelas declarações sobre as urnas eletrônicas e as ameaças às eleições, respectivamente. Jair Bolsonaro já estava na sua mira desde que o acusou mentirosamente de ser favorável à pedofilia. Fosse outro, o ministro teria entrado no jogo do presidente e o processado por calúnia. Seria, no entanto, muito pessoal e, como tal, impossibilitaria que ele julgasse qualquer caso envolvendo o presidente. Pode ficar para depois: o crime de calúnia demora quatro anos para prescrever. Muito melhor pegar o adversário institucionalmente neste momento.
“A obsessão por mim não faz nenhum sentido e não é correspondida”, disse ontem Luís Roberto Barroso sobre os ataques de Jair Bolsonaro. É verdade. Deveria ser mais um motivo para o sociopata temer o ministro.
O Antagonista