sábado, 9 de outubro de 2021

STF proíbe showmício gratuito, mas libera shows para arrecadar recursos já em 2022


A partir das eleições de 2022 os showmícios sem o pagamento de cachê aos artistas estão definitivamente vedados. Ao mesmo tempo, partidos políticos que quiserem angariar recursos para as campanhas eleitorais poderão organizar eventos fechados de arrecadação com apresentações musicais e cobrança de ingresso, por exemplo. Essa foi a resposta dada pelo Tribunal Federal (STF) à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.970 ajuizada por partidos políticos. O julgamento se iniciou na quarta-feira (6/10) e terminou nesta quinta-feira (7/10).

Prevaleceu o entendimento do ministro Dias Toffoli em todos os três temas enfrentados pela Corte: a proibição dos showmícios, a possibilidade de eventos musicais para a arrecadação de verbas e a não aplicação da anualidade eleitoral, isto é, novas normas eleitorais só podem ser aplicadas se as alterações ocorrerem um ano antes das eleições.

O julgamento do Supremo define questões importantes para as eleições, trazendo respostas a demandas que poderiam surgir ao longo da corrida eleitoral. Portanto, com a decisão, os partidos poderão organizar eventos particulares para angariar mais recursos para as campanhas eleitorais. O que significa, na prática, mais fontes de financiamento, além das doações de pessoa física e o fundo eleitoral partidário.

A possibilidade de showmício gratuito foi vista como inconstitucional por oito dos dez ministros participantes. A maioria dos magistrados acompanhou o raciocínio de Toffoli em que o showmício, mesmo gratuito, não pode ocorrer para não prejudicar a igualdade de condições aos candidatos à eleição e, dessa forma, evitar o abuso de poder econômico.

Além disso, o relator destacou que os shows, mesmo sem a remuneração dos artistas, é uma prestação de serviços para campanhas eleitorais e pode ser equiparada a uma doação em dinheiro e, atualmente, há um limite de doação previsto em lei. Acompanharam Toffoli neste tópico os ministros Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Luiz Fux. A ministra Cármen Lúcia e o ministro Luís Roberto Barroso entenderam pela possibilidade do showmício com artistas não remunerados. Para eles, a proibição fere a liberdade de expressão.

Para o relator do caso, a situação muda quando se trata de apresentações artísticas ou de shows musicais em eventos de arrecadação de recursos para campanhas eleitorais. Segundo Toffoli esta modalidade tem respaldo constitucional por se tratar de uma modalidade de doação que proporciona ao eleitor, enquanto pessoa física, participar do “financiamento da democracia representativa”, pois possibilita que o “cidadão viabilize ativamente o projeto político de sua escolha”.

Toffoli destacou ainda que a liberação das apresentações para arrecadação de valores para campanhas eleitorais não impede a apuração de eventuais irregularidades que venham a configurar atos de promoção de candidatura, desvirtuando-se do propósito arrecadatório declarado. Neste assunto votaram com o relator os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski.

Os ministros Nunes Marques, Gilmar Mendes e Luiz Fux divergiram. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes destacou que as apresentações musicais em eventos fechados para trazer recursos aos partidos serão impossíveis de serem fiscalizadas. Ele lembrou ainda que a legislação tem um teto de R$ 40 mil de doação da pessoa física ou um limite de 10% dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano anterior à eleição. Leia a íntegra do voto.

Para o ministro, na prática, a possibilidade de artistas participarem de eventos vai resultar em doação de pessoa jurídica, o que foi proibido pelo próprio Supremo.

“Não precisamos ser grandes iniciados no mercado de produção musical para saber que um show de um cantor renomado, uma dupla sertaneja ou uma banda de sucesso, enfim, quaisquer deles cobram bem mais do que R$ 40 mil reais. Só custará menos se incorrermos em uma economia criativa, em que a fraude começaria desde logo na declaração do valor”, afirmou o ministro durante a leitura do voto.

Também foi Gilmar Mendes que trouxe ao debate a validade da decisão do julgamento para as eleições de 2022. Para ele, como as eleições de 2022 serão em 2 de outubro, ela não poderia valer, pois estaria descumprindo a anualidade. Fux e Nunes Marques concordaram.

No entanto, prevaleceu o entendimento do ministro Dias Toffoli da desnecessidade da anualidade para o caso em análise. De acordo com Toffoli, o STF tem precedente no sentido de que, se a alteração não interfere no processo eleitoral, ela é válida mesmo sem ser um ano antes da eleição. O relator destacou ainda que a decisão não altera jurisprudência, nem marco normativo e que mantém regras que o próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já aplica.

Ação

Na ADI 5.970, PT, PSOL e PSB questionam a regra eleitoral que proíbe a participação de artistas em comícios e reuniões de candidatos. Os partidos pedem que o formato de showmício seja permitido para casos em que não há pagamento de cachê para os artistas. Os partidos argumentam que tanto a proibição dos showmícios não remunerados quanto a vedação de realização de eventos artísticos de arrecadação eleitoral afiguram-se absolutamente incompatíveis com a garantia constitucional da liberdade de expressão.

Um caso recente e polêmico foi a live de Caetano Veloso com cobrança de ingresso em apoio à Manuela D’Ávila para a prefeitura de Porto Alegre em 2020, em que a Justiça eleitoral gaúcha proibiu, e o TSE acabou autorizando. Outra polêmica envolveu Caetano, em 2012, quando o artista também fez um show para angariar fundos para a campanha de Marcelo Freixo à prefeitura do Rio de Janeiro.

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