O Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) recomendou que o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (Idema) cancele imediatamente uma licença de instalação de um parque eólico no município de Lajes.
Além disso, o Idema deve criar a Unidade de Conservação de Proteção Integral na área da Serra do Feiticeiro e serras adjacentes – Serra de São Francisco, Serra da Ubaia, Serra da Oiticica, Serra da Cacunda, Serra do Balanço, Serra do Bonfim, e Serra da Pedra Branca, tendo em vista a complexidade e importância ambiental da área já confirmada por meio de estudos e por uma portaria do Ministério do Meio Ambiente que a elege como área prioritária para conservação da biodiversidade do Bioma Caatinga, na categoria importância biológica extremamente alta.
O parque eólico que teve a licença de instalação expedida pelo Idema é composto por 102 aerogeradores e potência total de 632,4 MW, em uma área de 1.879,99 hectares, parcialmente inserido na Serra do Feiticeiro, em Lajes.
Na recomendação, o MPRN frisa que o licenciamento do empreendimento tramitou desde 2014 e que, mesmo após uma negativa do Núcleo de licenciamento de Parques Eólicos (NUPE)/Idema amplamente fundamentada na importância da área para a conservação da caatinga, em 2022 foi expedida a licença de instalação válida por quatro anos.
A Serra do Feiticeiro é uma área prioritária para conservação da biodiversidade do Bioma Caatinga, na categoria importância biológica extremamente alta, na qual apresenta endemismo animal, devido à presença da fauna representativa. O projeto intitulado “Oportunidades de Criação de Unidades de Conservação na Caatinga, com ênfase no Rio Grande do Norte”, realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e WCS/Brasil (projeto financiado pelo Fundo Brasileiro para a Biodiversidade) e com apoio do Idema, colocou a região como sendo a área número um no ranking das áreas prioritárias para a conservação.
A região na qual se encontra inserida a Serra do Feiticeiro se trata de uma das áreas de Caatinga mais bem preservadas e contínuas do Estado, que abriga em seus limites o maior fragmento de vegetação remanescente, com cerca de 53 mil hectares. Várias características foram listadas para definir a importância socioambiental da área, a exemplo da ocorrência de vultosa quantidade de espécies faunísticas, incluindo mamíferos de médio e grande porte, aves, morcegos e lagartos; da integridade da vegetação em bacias hidrográficas; da representatividade geomorfológica, principalmente pela posição das áreas nos gradientes topográficos; do tipo de vegetação – caatinga arbórea e arbustiva; e da ocorrência de cavernas e pinturas rupestres.
Dados coletados do Projeto Caatinga Potiguar demonstram uma alta representatividade de espécies da fauna ameaçadas de extinção, como é o caso do gato-do-mato-pequeno, jaguatirica, gato-mourisco, onça-parda, jacucaca; ou endêmicos da caatinga presentes naquela área, a exemplo dos morcegos Xeronycteris vieiriai e Lonchophylla inexpectata, sendo este último registrado unicamente, até então, em sítios localizados na Serra do Feiticeiro.
Nos estudos de monitoramento apresentados pela própria empresa foram citadas espécies ameaçadas e raras que ainda não se tinha registro concreto para a Serra do Feiticeiros, como é o caso do pintas-silgo-do-nordeste, espécie de ave ameaçada de extinção em nível nacional, e da onça-parda, sendo este o segundo registro da espécie no todo o estado, passando-se quase 10 anos após o primeiro que foi realizado em 2014, no município de Luís Gomes.
Além disso, a Serra do Feiticeiro tem importância arqueológica devido a ocorrência de grafismos rupestres na Pedra Furada, remetendo-se às atividades humanas pré-históricas. A riqueza do patrimônio espeleológico da área, que inclusive abriga a diversidade de morcegos, e não foi devidamente analisada nos estudos apresentados pelo empreendedor.
Para o MPRN, a instalação de um empreendimento de energia eólica na Serra do Feiticeiro e serras
adjacentes compromete a integridade das Áreas de Preservação Permanentes, dos fragmentos nativos de Bioma Caatinga, da preservação da geodiversidade e da biodiversidade; podendo levar, inclusive, à extinção de populações de espécies ameaçadas de aves e mamíferos.
O MPRN advertiu o Idema que o não cumprimento quando que foi recomendado pode implicar ao manejo de todas as medidas administrativas e ações judiciais cabíveis, em sua máxima extensão, inclusive, responsabilização pessoal dos gestores.
Leia aqui a recomendação na íntegra.